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Quando saiu do consultório eram três da tarde de um dia solarengo da capital. O calor desta cidade lacrada atingiu-o com um soco violento no queixo. Atordoado procurou de olhos semicerrados os seus óculos escuros, que pôs nos olhos sôfrego de sombra e silêncio.
O médico que tinha acabado de consultar tinha-o informado, ‘com muito pesar’, que tinha encontrado um corpo estranho na sua cabeça, uma coisa que nada tinha a ver com ele, com os seus sentimentos ou memórias. Tinha-lhe dito que aquele ser alienígena do seu corpo o mataria no prazo máximo de um mês. Melhor, tinha-lhe dito que ele tinha um mês de vida.
‘Engraçadinho o médico!’, pensou ele, ‘terá alguma bola de cristal? Porquê um mês quando eu posso morrer antes? Posso ser atropelado por este carro que aí vem a descer a rua’ e pôs um pé na estrada, devagar, sem pressas. ‘Ou posso morrer engasgado com o bife que vou comer logo à noite. O que lhe dá tantas certezas que só vou morrer daqui a um mês? É que essa certeza é mais do que alguma vez tive. Nunca soube se não ia morrer no segundo a seguir por alguma razão desconhecida. Portanto, se me afirmam com toda a certeza que só morro daqui a um mês, isso é mais do que eu tinha antes.’
E com esse pensamento tirou o pé da estrada, voltou para o passeio e foi atravessar a rua na passadeira.

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